Braga Netto negou qualquer plano de golpe e disse
que a “verdade será esclarecida respeitado o devido processo legal”.
Freire Gomes também foi alvo de uma ação
orquestrada, como indica o inquérito. Em depoimento, ele disse que recebeu
ataques pelas redes, assim como familiares — uma mensagem de Braga Netto o
chama de “cagão”. Já o coronel Corrêa Netto, também indiciado, difundiu cinco
fotos associadas a nomes de generais da ativa que estavam se posicionando
contra o golpe. “Quem dera fossem só esses”, enviou a um interlocutor, em 15 de
novembro de 2022.
No dia seguinte, ao
menos um perfil no X publicou as imagens com os dizeres: “Dos dezenove
generais, estes cinco canalhas não aceitam a proposta do povo. Repasse para ficarem
famosos”.
A
defesa de Corrêa Netto disse que aguardará a manifestação da Procuradoria-Geral
da República (PGR) para comentar.
Enquanto buscavam adesão, os
militares golpistas elaboraram uma carta como instrumento de pressão contra os
integrantes da cúpula que se opunham à ofensiva — Freire Gomes chegou a dizer
que prenderia Bolsonaro caso o golpe fosse adiante, como revelou a PF. O
documento foi discutido em reuniões, compartilhado via mensagens e depois
espalhado em redes abertas: houve uma petição no Facebook buscando apoio e
publicações no X.
A carta também foi publicada
em um site de petições on-line. Em uma conversa com o tenente-coronel Mauro
Cid, o coronel Anderson Moura encaminha o link e escreve: “Disparado”. Os dois
foram indiciados pela PF.
Depois que se tornou alvo de
investigações, Cid fechou um acordo de delação premiada com a PF e deu
informações sobre como integrantes do governo e das Forças Armadas se
articularam para manter Bolsonaro no poder. Procurada, a defesa de Moura não se
manifestou.
A PF apontou ainda o papel do
influenciador Paulo Figueiredo Filho na divulgação de informações falsas para
incitar militares a se voltarem contra os comandantes. De acordo com a
investigação, ele deu ampla publicidade à carta “para criar a falsa percepção
de que haveria um alinhamento das Forças Armadas ao golpe”. Figueiredo afirmou
que a conduta “criminosa” atribuída a ele é relatar os acontecimentos no Alto
Comando.
O inquérito mostrou também
que um integrante do esquema “paralelo” na Agência Brasileira de Inteligência
(Abin) comandava um grupo voltado à disseminação de desinformação e ataques a
ministros do STF. Chamado de “Grupo dos Malucos”, tinha como função principal,
segundo a PF, questionar a credibilidade do sistema eleitoral, insuflando a
tentativa de golpe.
Mensagens interceptadas
mostram que ele orientava os demais membros sobre os ataques que deveriam ser
feitos. ‘‘Senta o dedo para galera’’, escreveu, ao determinar a disseminação de
uma mentira relacionada a um familiar do presidente do STF, Luís Roberto
Barroso. A PF ressalta que a conversa mostra que “os servidores tinham
consciência que as notícias eram falsas”.
‘Falência do sistema’
Enquanto as novas revelações do inquérito vêm à tona, Moraes e
outros ministros do STF vêm defendendo a responsabilização das plataformas,
tema do julgamento em curso no STF.
— O 8 de Janeiro demonstrou a
total falência do sistema de autorregulação das redes — declarou Moraes na
sessão de quinta-feira.
O julgamento discute o modelo
de responsabilização das plataformas pelo conteúdo de terceiros. A análise teve
origem em dois casos que envolvem o Facebook e o Google, sobre uma dona de casa
que descobriu um perfil falso em seu nome para divulgar ofensas e uma
comunidade criada para proferir ataques contra uma professora.
As empresas alegam que já
dispõem de mecanismos de moderação e remoção de conteúdos, sem que haja
necessidade de uma regra que permita a remoção sem decisão judicial. Além
disso, citaram o esforço de autorregulação, com investimento em tecnologia para
combater crimes como pedofilia e discurso de ódio. Procurada, a Meta, também
dona do WhatsApp, disse que atuou para ajudar a proteger a democracia “antes e
em 8 de janeiro”. O Google não fez acréscimos ao posicionamento do julgamento.
O Signal não se manifestou.
— Caso o STF declare
inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil, menos conteúdos ofensivos vão
circular, porque as plataformas vão precisar ter mecanismos que evitem a
disseminação — avalia o advogado João Quinelato de Queiroz, do Instituto
Brasileiro de Direito Civil.
Professor da FGV Direito Rio
e doutor em Direito Civil, Daniel Dias acrescenta que hoje há uma “blindagem”
às plataformas:
— Se o artigo 19 cair, é um
reconhecimento de que as empresas precisam ser ativas no combate à
desinformação e à violação tanto de direito de pessoas quanto do Estado
democrático de Direito.
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